Mer & Heath's

Os sons. Os estilhaços. O pó. Os gritos ensurdecedores. O caos. Sinto que nem consigo respirar, quero sair daqui, abandonar este cenário mas nã consigo. E eles vêm na minha direcção e eu estou sozinho. Tenho um arma nos braços mas estou sem munições. E eles vêm aí. Tenho de ripostar. Tenho de atacar, não posso deixar que o pavor me pare. O inimigo alcança-me, pega-me pelo braço mas sacudo-o e contra-ataco. Como me ensinaram, derrubo-o e deito as minhas mãos ao seu pescoço.

Estava a tentar levar Heath para o quarto quando o seu corpo começou aos espasmos, a tentar afastar.me de si. - Heath sou eu, a Mer - disse enquanto ele me agarrava com força, de olhos vidrados. Tentei afastar.me porque percebi que ele estava a sonhar mas ele acabou por me agarrar pelo pescoço, sufocando.me

Era vida por vida. Só sei que era esse o instinto. Ou eu ou ele.... ela. O rosto deformado ganhou olhos azuis cristalinos e eu franquejei ao pensar em America. Nada fazia sentido na minha mente. Então os contornos do sitio de guerra desapareceram para dar lugar aos da nossa sala de estar...e nela eu com as mãos no  pescoço de America. Saltei para trás, imensamente confuso e, sobretudo, horrorizado comigo mesmo. Afastei-me o mais depressa e longe possível até ao extremo canto da sala. não conseguia respirar e estava todo transpirado. - O que é que fiz? - Olhei para as minhas mãos.

Debati.me contra as suas maos que pareciam ser feitas de ferro, arranhando os seus braços para o trazer de volta a realidade - Heath sou eu a Mer - tentei dizer novamente entre o pouco ar que conseguia ganhar. A minha visao começava a ganhar pontos pretos, significando que estava a perder consciência. Tão rapido como me tinha agarrado, soltou.me e eu cai no chao enquanto tentava respirar, começando a correr para me fechar na casa de banho

Não entendia nada do que havia passado. Não me lembrava de ver America chegar nem de me lançar a ela com as mãos ao seu pescoço. Não conseguia respirar direito nem raciocinar. A dor de cabeça era lacinante mas pior só a dor no peito: pavor, pânico, terror. Mas nada disto importou segundos depois quando me lembrei que America estava magoada. Corri para a porta da casa de banho até onde ela correra. Nem me aproximei. Mas gritei do lado de fora, dali de onde não a poderia magoar. - Mer - Queria perguntar: estás bem? Mas era claro que não. Estás magoada? Mas era claro que sim  - Mer, não sei o que é que se passou... America, precisas de ajuda médica? - Nem eu tinha noção do que lhe fizera.

Instintivamente, assim que entrei na casa de banho tranquei a porta, encostando.me a parede oposta. Deixei.me deslizar até ao chão, tapando a boca para evitar que ele ouvisse os meus soluços. Tentei fazer um check up mentalmente. A minha cabeça estava bem, sentia.me zonza mas nada demais; A minha garganta doia e custava engolir, provavelmente ia ficar com marcas; Tinha uma unha partida, provavelmente de o tentar arrancar de cima de mim aos arranhoes mas de resto estava tudo bem. Levantei.me e lavei a cara, tentando ver os estragos ao espelho

Quando ela não respondeu, fiquei a temer o pior. E se ela estivesse desmaiada no cão? Derrubaria a porta, mas também a podia magoar se ela estivesse pelo caminho - America? Estás consciente? - Tentei mais uma vez. Ela tinha de perceber pelo meu tom de voz que eu estava desesperado.

- Está tudo bem - tentei dizer mas a minha voz não soava a minha voz, estava rouca e custava falar mas agora seria assim nos próximos dias. Destranquei a porta e sai da casa de banho - Está tudo bem Heath - garanti - eu não preciso de um médico. Vamos para a cama

Mal ouvira o que ela dissera, mas ao menos sabia que estava desperta. Ainda assim, esta informação mal reduziu a minha preocupação. Dei dois passos atrás quando a porta abriu. Só não andei mais porque embati com as costas na parede. America estava... magoada. Por mim. Os olhos brilhantes com lágrimas e o pescoço vermelho com marcas das minas mãos - O que é que eu fiz? - Questionei retoricamente horrizado comigo mesmo. Como é que eu a pudera magoar? - Nem me apercebi que estavas perto de mim...  - Nada fazia sentido. 

- Shhh... - aproximei.me e segurei o seu rosto - Não foste tu, estavas a sonhar - olhei.o nos olhos - Estavas a sonhar, eu devia ter percebido - abracei.o para o confortar - Ha quanto tempo é que tens esses sonhos vividos ? - perguntei, passando a mao na sua testa suada

Retesei-me perante o seu toque. Tinha medo de a magoar. Medo de mim próprio. - Como é que é possível, Mer? Como é que te pude magoar? - Não processava na minha mente - Já os tenho há muito tempo, mas nunca desta forma. Nunca tão vívido assim... achei que eras... - até me custava dizer. 

- Porque é que nunca me disseste ? Nunca me contaste que tinhas esses pesadelos - o meu tom soava ainda mais magoado. - Não te afastes de mim.. está tudo bem - voltei a repetir, beijando.o - Heath a culpa nao foi tua, nao estavas em ti. Agora que estas acordado, queres.me apertar o pescoço ? Estrangular.me ?

- Heath tu podes e vais dormir perto de mim. Se não reparaste ontem não aconteceu nada, nem nos dias em que dormimos em minha casa - suspirei, puxando.o para o quarto - Eu sei que não estavas em ti, eu não te estou a culpar de nada. Anda comigo - pedi enquanto o beijava

Eu queria muito acreditar nela. Queria muito aprofundar aqueles beijos e cair na cama com ela, mas não me saía da cabeça aquilo que eu fizera nem me escapava à vista as marcas que ela tinha no pescoço. Quebrei o beijo a muito custo e recuei - Não, vou dormir no sofá. Descansa aqui. Vou hoje ainda ver um psiquiatra - Ou alguém, quem quer que fosse, até ter a certeza que não a voltaria a colocar numa situação de risco.

- Heath sao quase cinco da manhã. Não está nenhum psiquiatra para te ver, nem para te atender. Vamos para a cama e amanha de manha logo vais comigo ao hospital e falas com a tua psicologa - suspirei - Não vais dormir no sofá. Se não queres dormir comigo, apesar de não ter medo de estar contigo, tudo bem mas tu vais para a cama. Eu fico no sofá - puxei.o pela mao para ele entrar no quarto. - Podemos ficar os dois aqui ? - pedi, sabendo que ele nao me iria deixar ir para o sofá

Todo eu estava feito de ansiedade e stress com o rumo que aquela madrugada assistira. - Assim que for horas de a clínica do hospital abrir, estarei lá - Nem conseguiria dormir antes disso - Mer, nem pensar. Vai descansar e na nossa cama. - Não aconteceria de outra forma. - Dorme. Eu vou estar na sala. Não vou dormir, sequer. Por favor, fica aqui.

- Eu não vou ceder, não depois de te culpares tanto por uma coisa que nao e culpa tua - cruzei os braços - chegámos a um impasse. Como é que vai ser ? Vens para a cama comigo ou vamos os dois para o sofá e eu fico acordada contigo depois de um turno de 12 horas ? - perguntei - Eu acho que a cama seria mais confortável mas estou disposta a ir para o sofá, já dormi em sitios piores - encolhi os ombros

Como é que ela podia dizer que não era culpa minha quando tinham sido as minhas mãos enroladas em torno do seu pescoço? Podia não estar consciente, mas fora eu. - America, por favor, estou a pedir-te. Não faças isto agora. - Eu estava cheio de medo de adormecer sob o mesmo tecto que ela. Não era aquela a conversa que queria estar a ter - Fica aqui.

E não fazia eu sempre como ela dizia? Acabei por assentir e corresponder ao seu pedido. Estava demasiado cansado e queria que também ela descansasse. No entanto, fui incapaz de dizer mais alguma coisa. Deitei-me na cama e esperei que ela fizesse o mesmo.

Despi.me, ficando apenas em lingerie e abri a cama, deitando.me ao meu lado - Hoje fiz a minha primeira visita domiciliaria.. - murmurei enquanto me encostava a ele, olhando para os seus olhos - a rapariga tinha sido violada, pelo ex namorado.. estava tao quebrada - murmurei num suspiro - O namorado dela fez.me lembrar a tua personalidade, sempre tao cuidadoso com ela, a olhar com tanta atençao

Estava deitado a ouvi-la. A minha mente era um reboliço. Queria apoiá-la, mas não me estava a sentir digno da sua comparação. Fiz um esforço para não desviar o olhar.

- nao olhes assim para mim - pedi, vendo a dor no seu olhar pelo que me tinha feito - consigo ver nos teus olhos que estas a pensar no que aconteceu. Durante tanto tempo dormimos juntos e nada aconteceu. Nao tens de ter medo, nao me vais fazer mal, eu sei que nao eras tu. Nao estavas em ti