Mer & Heath's

- E tu ainda querias dormir fora da cama. Não aguentavas dois dias sem estar junto de mim, a abraçar.me - passei as maos pelos seus cabelos molhados. Afastei.nos, sorrindo ao perceber a sua expressao desiludida - Sem me tocares ou poderes estar comigo intimamente

Agarrei na sua mao e puxei.o até mim, até estarmos novamente juntos e juntos a parede - Eu sei o que é isso, é como se o teu toque resolvesse todos os problemas. Basta um abraço teu e todas as preocupações desaparecem por momentos e sou apenas eu e tu

Era com se America lesse a minha mente por momentos pois era exactamente aquilo que ela dissera. - Eu e tu - Concordei deliciado e completa e irremediavelmente apaixonado.

As semanas foram passando e nós acabámos por conseguir achar uma rotina para conseguirmos tempo a dois apesar dos horários que eu tinha no hospital. - Heath, não te esqueças que hoje tens terapia - disse enquanto acabava de me vestir e ele fazia o pequeno almoço

Semanas tinham-se passado e tinham sido as melhores semanas da minha vida. Apesar de ainda estar invadido por pesadelos, mais nenhum percalço tinha acontecido. A terapia estava a deixar-me mais sereno à noite, a fisioterapia também já que o meu corpo entrara finalmente nos eixos. Se não estava no hospital em terapia ou fisioterapia, então estava no gabinete da assistente social ou à espera de America. O meu tempo era compartimentado desta forma mas, verdade fosse dita, eu andava irritadiço porque tinha demasiado tempo livre e precisava de arranjar algo para fazer. No entanto, sempre que levantava sugestões a America, ela priorizava sempre a minha "recuperação completa" antes de eu me meter a fazer alguma coisa.

- Sim, Mer. Às 11h, eu lembro-me! - Confirmei enquanto acabava de colocar os ovos mexidos no prato onde já deixara as torradas. - Vejo-te por lá ou será que vais ter um turno muito caótico? Em que ala hospitalar te colocaram desta vez? 

Desci enquanto guardava o meu pager - Não sei, andamos a fazer mais rotações do que o normal, por isso não me admirava que chegasse lá e não estivesse no mesmo sitio - olhei para as horas e para o esforço que ele tinha feito a fazer o pequeno almoço. Não tinha tempo para comer mas iria faze.lo na mesma - Não te esqueces agora mas ainda te distrais e depois não apareces - pus cafe numa caneca enquanto dava uma dentada no pao - se precisares que te lembre, diz. Estas muito melhor na cozinha, um verdadeiro chef - beijei a sua bochecha enquanto punha uma maça na mala

Sorri perante o seu elogio. Começara a desenvencilhar-me na cozinha. Passava imenso tempo sozinho em casa e várias refeições sozinho também já que a maioria dos turnos dela estendiam-se por essas horas - Espera só até te dar a provar algumas das receitas que tenho anotado - Pisquei-lhe o olho. Fui arrumando tudo na cozinha para que ela não tivesse tentações de o fazer. Sabia que ela já estava atrasada - Eu não me vou esquecer. - Assegurei mais uma vez - Mando-te mensagem quando chegar para saber se estás alcançável ou não.

Acabei por meter metade da torrada na boca enquanto colocava o cafe num copo de viagem - está bem, vejo.te lá. Até logo - disse de boca cheia, dando.lhe um beijo cheio de migalhas - Assim que tiver tempo livre aviso.te - sai a correr, pegando nas minhas coisas a pressa

Não ficava surpreendido pelas suas saídas a correr. Era sempre assim e já me habituara. Divertia-me, até. Pensei nisto enquanto limpava e arrumava a cozinha. Tinha umas horas para matar por isso fui correr. Quando voltei para casa tive apenas tempo de tomar um duche e vestir-me rapidamente para depois me enfiar no metro e chegar ao hospital a tempo da consulta de psiquiatria. Mandei uma mensagem a America antes de entrar, mas como não me respondeu deduzi que estivesse bastante atarefada no seu trabalho, como era de esperar. 

Andava exausta das trocas de turnos, dos horários instáveis e das poucas horas de sono que tinha. Estava mais uma vez num turno atarefado quando senti o telemovel no meu bolso vibrar e percebi que Heath já tinha chegado. Mentalmente fiz um lembrete para dali a uma hora passar pelo consultorio para saber se ele estava ocupado ou se ja estava despachado. Iria ve.lo antes dele ir para casa

Saí da sessão de terapia como sempre saía: com uma valente dor de cabeça e sentimento de impotência. Se por um lado ajudavam-me a dormir com menos pesadelos à noite, estas sessões disparavam memórias confusas que não conseguia descodificar para identificar quem eu era. Desta vez a médica recomenda, novamente, que eu me distraísse com outras coisas e não pensasse tanto nisto, mas eu já não sabia o que fazer. Já preenchia o meu dia com uma corrida matinal e outra nocturna, sessões de terapia mental e física, as tarefas domésticas e o tempo que passava com America. Tudo o resto parecia proibido. 

Era escusado que estava para lá de frustrado quando saí do consultório e olhei em redor para o caso de America ter aparecido.

Quando finalmente virei o corredor da ala da psicologia, vi.o no meio do corredor, com os seus ombros em baixo como sempre acontecia quando ele saia de uma das consultas. Como já ia a correr, acelerei, saltando para as suas costas - como está o meu homem ? - perguntei, beijando a sua bochecha - tenho aproximadamente dez minutos antes de ter de voltar - sai das suas costas e prendi o cabelo devido ao calor

Demorei um segundo a raciocinar que não estava a ser atacado, ou melhor, que estava a ser atacado mas não por uma ameaça. Consegui esboçar um sorriso fraco quando me virei para a encarar. America estava adorável com as bochechas rosadas. - O normal. Mais do mesmo - Informei para que ela não esperasse avanços significativos no meu estado clínico mental. - melhor agora que estás aqui - roubei-lhe mais um beijo.

- Pode ser que os sonhos eventualmente acabem por desaparecer - sorri contra os seus lábios - olhem para mim que tenho um graxista em casa - ri.me - Tens fome ? - perguntei - Podiamos ir a cafetaria para comeres qualquer coisa - disse enquanto passava a mao pelo seu cabelo para o por no sitio

Eu tinha um pressentimento que a situação não seria essa e que os sonhos - ou, melhor dizendo, pesadelos - se quedariam ainda por algum tempo. Mas não lho ia dizer e arruinar a esperança que ambos partilhávamos. 

Sabendo que durante o seu turno ela mal parava para comer, não iria dizer que não - Sim, vamos lá! - Ao menos assim garantia que America comia e descansava um bocado. Seguimos lado a lado, muito próximos, até à cafetaria. Apesar das opções saudáveis, fiquei-me por um dos poucos donuts que haviam. Escolhemos uma mesa na esplanada já que fazia sol - Hoje a doutora voltou a reafirmar que tenho de preencher mais o meu tempo e manter a cabeça ocupada. - E era sempre assim que eu começava a conversa na qual lhe dizia que ia arranjar um emprego, conversa essa que acabava sempre sem a aprovação veemente de America.

Quando estava no hospital nunca andava de mao dada com ele mas andavamos com os nossos bracos a rocarem um no outro ligeiramente. Ja na cafetaria ele optou por um donut e eu pedi uma maca e um sumo. Assim que ele começou a falar, percebi que a conversa nao ia num bom caminho - Podes sempre achar algum hobby, algumas aulas fr culinaria - sugeri, evitando o topico de trabalho. Eu continuava a achar que ele nao estava preparado para tal, que precisava de se concentrar na sua recuperação e nao num trabalho 

Tive que me esforçar a sério para não revirar os olhos com a sua sugestão. Sabia que ela o fazia com boa intenção, mas começava a roçar os meus nervos - Estaria a fazer algo de útil com o meu tempo? Não - Soltei um suspiro frustrado - Estive em coma 8 meses. Estou acordado há quase um ano. Já desperdicei demasiado tempo. Preciso de fazer algo que me faça sentir útil - Era algo que me estava a consumir por dentro. - Além disso, é incomportável que continues a ser a única a suportar as despesas lá em casa - era certo que eu recebia um subsidio estatal mas não era, de todo, suficiente nem quase nada quando comprado com os seus rendimentos.

- Claro que estás a fazer alguma coisa de útil, estás a passar por uma recuperação - respondi.lhe, ignorando o seu tom - E com aulas de culinária estarias a aprender a cozinhar, a aprender algo útil para a tua vida pessoal e também podia servir depois para curriculum - expliquei - Não precisas de um trabalho Heath, eu ainda não me queixei com despesas, pois nao ? - perguntei - Não vivemos propriamente em nenhuma mansão mas acho que não estamos mal

- Não estamos mal nem é isso que quero insinuar. Apenas que levamos uma vida a dois, mas os encargos só estão a cair num - Novamente, uma conversa que não ia a lado nenhum. Seria melhor deixá-la por ali e aceitar que ela não entendia. Acabei de comer o meu donut - Vemos-nos mais logo, sim? Vou estar à tua espera - Disse enquanto me levantava da cadeira.

- Eu quando me mudei para uma casa contigo sabia como iam ser as coisas Heath, não fui a pensar que tu ias começar a trabalhar logo de imediato. - respirei fundo - Não vale apena esperares acordado, não sei a que horas chego - respondi.lhe, deixando a minha maça no sitio e saindo dali primeiro que ele. ele conseguia ser tão teimoso no que tocava a ele arranjar um emprego, conseguia.me tirar do serio

Era escusado dizer que aquele encontro não correra da pior maneira.  Nenhum dos dois cedia. Caminhei para o metro algo aborrecido pela situação, tanto que preferi continuar a apanhar ar e seguir a pé para casa, apesar de isso significar uma caminhada de cinquenta minutos. Teve o efeito esperado e comecei a ficar tranquilo à medida que caminhava. Ia distraído e, a dada altura, ia chocando contra alguém que acaba de sair de um café. Curiosamente, estava em frente a um café bistrô onde uma placa branda me puxou pela atenção. «Precisa-se empregado». Devia ter pensado duas vezes mas não o fiz e entrei. Fiquei na fila - o sítio era concorrido. Quando chegou a minha vez pedi um mocha latte  e acabei por dizer - Vi o sinal lá fora. Ainda estão à procura de reforços? - E devo ter feito o meu melhor sorriso porque a rapariga encaminhou-me a outra mulher que estava do outro lado do balcão, não muito mais velha do que trinta e cinco anos. 

- Foste rápido. Colámos aquilo há meia hora - Informou-me ao mesmo tempo que simpaticamente me guiou até uma mesa do café onde nos sentámos. - És entrevistado agora, então. Para quê perder tempo? - Pois, pelo volume de pessoas dava mesmo para ver que precisavam de alguém.  - Conta-me  sobre ti, experiência profissional e essas coisas todas. O típico de uma entrevista. Começa.

Bom, o meu cérebro não se lembrava do que era típico de uma entrevista.Na verdade, havia pouco que eu lhe pudesse dizer. Comecei a ter dúvidas de que me pudessem contratar para trabalhar ali - Bom, o meu nome é Heath e esta é, literalmente, a única informação certa que posso dar - Vi-a erguer a sobrancelha e procedi à explicação de como estivera num coma e estava amnésico, de como passara meses a recuperar as minhas capacidades motoras mas que só agora me sentia minimamente bem, de que tentava recuperar a memória - Sei que não deves ter candidatos como eu todos os dias, nem que tenho a certeza de que tenha experiência em cafés, mas se calhar até tenho! Sei que estou pronto para pôr as mãos na massa e tenho a disponibilidade - A chefe, cujo nome era Melinda, parecia ponderar a hipótese.  Estava surpreendida com a minha história. 
- Fazemos assim. Fazemos o teste. Trabalhas as próximas três horas até o café fechar. Se te integrares, ficas! Agora vamos lá, não há tempo a perder - Aquela era uma mulher despachada, disso não havia dúvida. Deu-me um avental com o logo do café e a informação básica do serviço e de quais as minhas tarefas. E assim foi. Baralhei-me nalguns pedidos, levei tempo a fazer alguns dos cafés mais elaborados mas acabei o serviço. E no fim desse tempo, já depois de as ter ajudado na limpeza do café, a Melinda apenas se lançou para um abraço e disse - Bom trabalho Heath! Pode ser polido mas vê-se que aprendes rápido. Segunda-feira começas às 9h e revemos o contrato! Obrigada pela ajuda hoje.
Com o pagamento das horas no bolso e a promessa de um emprego, saí do Monmouth Coffee House cansado mas felicíssimo. Agora como contaria isto a America?

Estava furiosa com ele e com a medica. Eu sabia que ele precisava de se distrair mas porque é que ela nao podia dar sugestoes que nao envolvessem ele arranjar emprego ? Continuei o meu turno, tentando.me distrair daquilo. - Sinceramente é preciso paciencia - fui resmungando entre dentes - até parece que ele é algum fardo. até parece que eu alguma vez comentei ele não ter emprego - decidi ficar horas extra, chegando a casa ja de madrugada