Mer & Heath's

- Quando e que a Dra. DeLuca falou nisso ? Ela não falou disso comigo - franzi a sobrancelha. Estava eu tao fora de mim que não me tinha lembrado - Mas eu nao preciso. Eu sei os passos do luto. Negação, raiva, negociação, depressão e aceitação - fui levantando os dedos para ele saber que eu os sabia

A minha memória falhava-me. Talvez ela mo tivesse dito apenas a mim, mas bom, agora ela sabia - Bom, disse. Vais considerar? - a resposta foi quase imediata - Mer, isto não é um exame oral e tu não és a tua própria paciente - uma coisa era sabermos estas coisas em relação aos pacientes, outra muito diferente era auto-psicoanálise - Por favor, promete-me apenas que se sentires que precisas de ajuda, a vais pedir. Fala comigo pelo menos. Não escondas mais - supliquei.

Fechei os olhos. Tudo o que eu tinha feito com ele era falar e falar so abria ainda mais as feridas, nao as deixava sarar. Era como arrancar uma crosta de uma ferida, sempre que o fazíamos começava a sangrar - Mason, tudo o que eu tenho e falar contigo. Talvez seja a raiva a falar mas eu nao vou falar com um psicólogo que nao sabe o que eu estou a passad. O que eu preciso e de esquecer o que aconteceu, esquecer tudo

Não ia discutir com ela. Não era, de todo, aquilo que pretendia, por isso achei por bem calar-me antes de sem querer despoletar uma discussão - Ok, Mer -  O que faria era estar atento. Sabia que era impossível ela esquecer tudo. Antes pelo contrário, duvidava que houvesse um único dia da sua vida em que ela não se lembrasse disto. - Queres doar esse leite também? Podemos pôr no frigorífico e alguém do hospital passar para o recolher. 

Olhei para o meu peito e para a garrafa que estava cheia. Assenti, tirando a bomba - sim, ao menos ha algum bebe que vai poder aproveitar. Eu vou tomar um duche, ja estou a precisar - rodei os ombros para aliviar a dor de costas - ja venho. Eu se precisar de alguma coisa, chamo-te

Fui ate a casa de banho, suspirando quando senti a agua quente cair sobre as minhas costas. O quente ajudava nas dores do corpo mas de resto, nao aliviava nada. Acabei por passar o gel de duche apenas com as maos porque estava muito dorida e dar uma lavadela ao cabelo. Quando sai do banho embrulhei-me numa toalha. Deitei o pijama do hospital no lixo, reparando nas vitaminas pre natais no armario. Peguei nelas e atirei-as contra a parede, juntamente com metade das coisas que tinha na bancada

Quando ouvi um pequeno estrondo vindo da casa de banho, não hesitei a ir correr e bater à porta. - Mer? Estás bem? - perguntei preocupado.

Não, eu não estava bem e provavelmente nunca ia estar. Ofegante do pequeno esforço que tinha feito, olhei para os estragos a minha volta e decidi que não me ia preocupar com isso neste momento - Sim, Mace - disse, abrindo a porta da casa de banho - Dentro dos possíveis. Dói-me o corpo, estou com cólicas mas nada que um comprimido não ajude. O que é que temos de fazer para ir vestir a Haven ?

Quando ela abriu a porta e  consegui espreitar lá para dentro vi como havia imensa coisa espalhada pelo chão. Decidi não comentar. - Ainda bem que decidiste tomar alguma coisa para as dores - Era um inicio - Basta ir. Reservei uma sala privada. Se quiseres podemos lá ficar até à cerimónia - O que um pequeno suborno tinha permitido.

Assenti, passando por ele para me vestir. Não sabia o que vestir para ir, preto não parecia correto. - Eu.. não sei o que vestir - suspirei, falando com ele como ele queria - parece errado vestir preto, também me parece errado vestir branco - era um dilema ridiculo no meio disto tudo - Eu sei que é parvo estar preocupada com o que vou vestir mas - encolhi os ombros, nao sabendo como justificar o que tinha dito

- Não, não, não me parece trivial de todo - garanti e falava a verdade. Este era um momento do qual ela nunca se esqueceria - Há alguma roupa que te tenha sido especial durante a gravidez? Talvez pudesses gostar de vestir algo que te faz pensar na Haven - sugeri.

- Eu passava maior parte do tempo nos scrubs do hospital, a trabalhar - baixei os olhos para o chao. o meu cabelo e corpo estavam a molhar o chao mas nao queria saber - Eu comprei um vestido azul e rosa para quando a barriga crescesse mais, a minha intençao era fazer toda uma photoshoot - encolhi os ombros

Pois, por momentos esquecera-me fo facto que ela tinha andado a fazer turnos longuíssimos,  raramente saindo do hospital - Bom, podes mostrar-me essa opção, que tal? Se o querias vestir antes, agora é a tua oportunidade - Já que ambos sabíamos que o seu corpo não ia mudar no sentido de ela preencher aquele vestido, mas antes o contrário.

Por momentos fui apanhado de surpresa quando a vi. Se a estivesse a ver pela primeira vez em meses teria-me apercebido logo que estava grávida. Era lamentável que já não fosse o caso - Acho que funciona muito bem. Estás bem - respondi com sinceridade. Não sabia como ela responderia a elogios. - Alguma coisa mais que queiras trazer?

Peguei nas roupas que tinha escolhido e, acabei por pegar num pequeno coelho de crochet que tinha comprado - Eu acho que é tudo, não sei que mais trazer - abracei o peluche contra mim - vamos. temos de ir agora

- Assim sendo vou chamar um Uber  - já que ambos os nossos carros estavam no estacionamento do hospital. Já era de noite quando saímos da sua casa e meia hora depois chegamos à agendência funerária, uma das melhores da cidade, assegurara-me. Apertei a sua mão antes de entrarmos.

Olhei para a funeraria que me era desconhecida - Eu juro que te pago tudo - prometi quando ele me apertou a mao. Sabia que ele tinha feito as decisões todas e, por isso, estava-lhe grata. Se tivesse de fazer as decisoes sozinha provavelmente escolheria uma coisa qualquer mas Mason escolheu o melhor, dadas as circunstancias. Entrelacei os nossos dedos e, utilizando a sua confiança em mim dei um passo. Eu devia isso a minha bebé, ser forte por ela

- Mer, por favor, não penses nisso agora - ela sabia muito bem que o dinheiro não era um problema para mim. O salário que recebia do hospital era uma ninharia comparado com aquilo que recebia da minha família todos os meses. Foi-nos indicado o caminho até uma sala mais privada. Era pequena,mas majestosa, estilo vitoriano. Um pequeníssimo caixão aberto estava no meio da sala, rodeado de flores, tal como o resto da sala estava. Esperei que Mer tomasse o primeiro passo.

A sala era um sonho, se não tivessemos numa funerário seria um lugar bastante romantico. As flores tinham um cheiro avassalador, era algo que não esqueceria. Olhei para o caixao branco no meio da sala - é tão pequenino - murmurei, sentindo as lágrimas a picarem os olhos. Não estava a espera de um grande caixao mas quase que parecia uma caixa de jóias. Sabia que me devia aproximar, tomar as redeas da situaçao e cuidar da minha bebé mas estava colada ao chao

Ela já se despedira da bebé mas agora teria que o fazer novamente pois a meros dois metros ali estava Haven. - Queres que a traga até ti? - Talvez fosse mais fácil para ela assim. Indiquei-lhe que se sentasse no cadeirão da sala.

abanei negativamente a cabeça - eu só preciso de um momento - pedi-lhe quando ele me guiou ate um cadeirao. tinha as maos fechadas em punho, apertando os materiais que tinha trazido. como e que eu viveria o resto da minha vida, sabendo que a minha filha nao o poderia fazer ? a única coisa boa da situaçao e que Heath não teria de passar pela mesma dor que eu. Ele estava junto a sua familia em Boston e eu do outro lado do oceano. Comecei a falar mas não sabia o que dizer. Levanta-te America, disse para mim. Levanta-te e cumpre o teu dever como mãe e cuida da tua bebé pela última vez. Depois de alguns minutos sentada, de pernas trémulas levantei-me e dirigi-me até ao caixão

- Temos a noite toda - Só para que ela soubesse. Não tínhamos que ir a lado nenhum antes do cemitério. Desta vez fiquei onde estava antes. Parecia-me que era um momento que ela precisava de fazer sozinha. 

Lentamente aproximei-me do caixao, parando em frente a ela. Parecia que estava a dormir pacificamente no meio de uma nuvem. As lágrimas começaram a cair e rapidamente tentei limpá-las. Queria vê-la, queria decorar cada detalhe do seu rosto para nunca o esquecer. Lentamente, desembrulhei a manta onde a tinham colocado e mudei-a de roupa, tentando ignorar a sua pele fria ou a rigidez do seu corpo. Ela está só a dormir. Quando acabei, voltei a embrulhá-la na mantinha, colocando o peluche contra si - assim nunca vais estar sozinha - beijei a sua cabecinha, pegando no telemovel para lhe tirar uma foto mas mal conseguia segurar no telemóvel de tanto tremer